Atividade de currículo e cultura educacional
Trilhas da Educação - Da Escandinávia à Ásia
Ao compararmos o modo como os currículos são planejados, nas escolas ao redor do mundo, podemos observar uma relação dicotômica entre um grupo que se aproxima da linha tradicional, presente no sistema jesuíta, e um outro grupo, influenciado pelo humanismo da linha marxista acadêmica. É interessante notar que os dois modelos produzem frutos, reconhecidos mundialmente, pelo exame do PISA.
Dentro do bloco de países asiáticos, como China, Taipei, Hong Kong, Japão e Coréia do Sul, encontramos um modelo de absorção de informações em demasia. Os alunos são pressionados à se manter dentro de um sistema competitivo e árduo. Nestes países é comum presenciarmos jovens estudantes retornando por volta das 22:00 aos seus lares. Para regressarem no dia seguinte, logo pela manhã. A técnica curricular oriental, privilegia o acúmulo excessivo de conhecimentos. Em países como a Coréia do Sul, os alunos são obrigados à irem para a biblioteca escolar, após as aulas, para praticarem os conteúdos, enquanto são monitorados e observados pelos professores. Sob pena de castigo físico por meio de réguas. Ainda pelo oriente, é comum uma expressão que diz, "o prego que se destaca, é martelado". De uma forma geral, a cultura asiática é marcada pelo conservadorismo e pelo paternalismo. Um dos motivos que justificam o modus operandi de seus planejamentos curriculares e de suas gestões educacionais. Deste modo, os fatores culturais, produzem uma educação próxima do modelo "tradicional"(como conhecemos no ocidente). Esta, é marcada pela presença do professor, como figura central no processo educacional em sala de aula. Enquanto que o aluno age de maneira passiva. As informações levantadas, devem ser internalizadas, sem que haja comparações com a realidade social. Este modelo, produz e tem produzido, resultados satisfatórios em exames internacionais. Contudo, gera danos psicológicos aos estudantes. A submissão exacerbada, lhes priva de atividades lúdicas ou de momentos comuns de lazer e descontração. O clima é permeado de ansiedade e insegurança.
Na contramão deste modelo, encontramos países como a Finlândia e a Estônia, que valorizam a liberdade de seus alunos, em contraposição ao modelo tradicional e impositivo, praticado nos países asiáticos.
Ao tomarmos como exemplo a Finlândia, um país sempre muito bem colocado nas avaliações do PISA, descobrimos que seu modelo privilegia a ociosidade, a interação em sala de aula e o reforço positivo. Em geral, o turno escolar não passa de quatro horas de duração. Além disso, à cada hora de aula são dados pelo menos quinze minutos de intervalo e descanso.
Através de pesquisas científicas, constatamos que a liberdade pedagógica, aplicada nas escolas Finlandesas, estão de acordo com o funcionamento neuropsicológico comum de todo ser humano. De acordo com a ciência, nosso cérebro costuma perder até 60% de toda informação recebida. Como outro exemplo, Mario Sérgio Cortela, um especialista da área educacional, ilustra a diferença entre, "informação" e "conhecimento". O primeiro é esquecido. O segundo não. Como exemplo ele toma a habilidade de andar de bicicleta. "Quem aprende à pedalar, nunca mais esquece. Apenas perde a prática". E um dos fatores necessários para que um conhecimento seja associado é o interesse. Neste ponto, nos deparamos com mais duas características da educação Finlandesa. O estímulo dos pontos fortes e o uso do aluno, como ponto de partida, para projetar aulas de acordo com suas decisões. O aluno escolhe por si só, como irá trabalhar o assunto e que metas irá atingir. Assim, unem-se habilidades predispostas com objetos de interesse. Como resultado temos uma construção muito mais significativa para o aluno.
Podemos constatar que o método aplicado na Finlândia se aproxima da vertente curricular Crítica. Marcada pela influência dos textos marxistas. O próprio Marx, em seus trabalhos, apontava que um modelo educacional adequado, deveria oferecer ao aluno, meios de se desenvolver duplamente, como profissional e cidadão. Emancipado e ativo. Capaz de compreender o mundo onde vive. E de intervir. Vale ressaltar que a formação cidadã, embora seja associada pejorativamente à um sentido de utopia, pelo senso comum, é na verdade uma ferramenta de saúde social. Pois os problemas sociais devem são combatidos em sala de aula. A violência, a xenofobia, o preconceito étnico-racial, a homofobia, a dependência química, a gravidez precoce... .
Assim, valendo-se do respeito às alteridades, como visto anteriormente, encontramos o modelo Pós-Crítico. Esta vertente busca combater toda forma de "pré-conceito" em sala de aula, para gerar uma sociedade mais igualitária. E equânime. Ao passo em que assume a representação de toda sorte de minorias, excluídas pela sociedade. Pessoas homoafetivas, ou de diferentes etnicidades, afrodescendentes, ou com problemas intelectuais, cognitivos, pacientes psiquiátricos, mulheres... . Todos contemplados por ela.
A história do Brasil foi marcada por personalidades relevantes no âmbito educacional. Como exemplo, Paulo Freire, Leonel Brizola e Darcy Ribeiro. Paulo Freire, em seu livro, "Pedagogia do Oprimido", defendia uma educação como processo de autonomia, contraposta ao conceito de, "Educação Bancária". Concepção usada para criticar a recepção passiva. Enquanto que Brizola e Darcy Ribeiro, construíram mais de 500 unidades de CIEP'S, pelo Rio de Janeiro. Para fomentar a educação e romper com a barreira das desigualdades, muito mais díspares e segregadas. Um cenário desolador muito comum na década de 80. E todas estas personalidades mantinham pontos de vista concernentes com a Teoria Crítica Curricular, pois criticavam a ausência de assistência governamental, os antagonismos entre as elites e os cidadãos de baixa renda, um sistema escolar deficiente, uma população com pouca escolaridade, entre outros fatores. Os quais, privavam aquelas pessoas de uma vida digna, no seu sentido mais estrito e fundamental.
Retomando mais uma vez, aos países asiáticos, podemos usar o Japão para abordar um outro cenário. O cenário das consequências que um sistema escolar, pouco humanista e condescendente com a industrialização massiva, pode gerar. Como dito anteriormente, o sistema curricular asiático, em geral, se preocupa muito mais com uma formação tecnicista e profissional, do que humana. O foco da educação, nestes países, é o desenvolvimento do sistema industrial e tecnológico. Hoje, podemos observar que este tipo de direcionamento curricular, quando visado como única prioridade, causa sérios danos à vida social. No Japão, uma certa parcela dos jovens adultos tem optado por viverem sozinhos. Sem constituírem famílias. Nem buscam por companheiras(ou companheiros). E este fenômeno é abordado nas pesquisas do falecido sociólogo, Zygmunt Bauman. A modernidade e a cultura excessiva do consumismo, são responsáveis por corroer os vínculos afetivos sociais. Isto é, a maneira como as alteridades, não pertencentes à nossa família, são tratadas. A ausência de coesão social. A imersão no individualismo. Interessante ressaltar que a própria Primeira Ministra, Margareth Tatcher, declarou que: "não existe sociedade. Existem homens e mulheres individuais". Lembrada pela implantação de políticas neo liberais, no Reino Unido, pelos anos setenta.
Apesar dos sistemas pedagógico curriculares estarem ligados intrinsicamente à cultura de seus países, ainda assim, podemos reconhecer os malefícios que o sistema tradicional produz, como referido agora pouco, sobre o Japão.
Constatamos que países como a Finlândia, ocupam também o ranking de população mais satisfeita. Mais feliz. Pois, as estratégias aplicadas, demonstram que não almejam somente o desenvolvimento técnico-industrial. Buscam desenvolver cidadãos humanizados. Propostas atreladas às teorias curriculares, "crítica" e "pós- crítica". Que privilegiam a liberdade, a recreação, a criatividade, a socialização, o senso crítico, a observação, o questionamento. A solidariedade, a empatia, o respeito. As brincadeiras, os desafios, a curiosidade.
Assim, concluindo, pudemos abordar três correntes teóricas, curriculares, e relacioná-las à realidade de dois continentes: asiático e europeu. Onde a Finlândia, próxima da Escandinávia, gere suas unidades escolares com premissas das Teorias, Crítica e Pós-Crítica. Instigando o diálogo, as interações e o questionamento. E onde países como, China, Japão, Taiwan, Taipé, Hong Kong, Coréia do Sul, Macau, Singapura, gerem suas instituições de ensino com diretrizes da Teoria Tradicional. Valorizando assim, a submissão e passividade do aluno, perante o professor, sua primazia, como autoridade, a carga horária sobrecarregada e outros elementos que a caracterizam como tal.
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